POR MARI MONTEIRO
A partir de um
neologismo e sob a INSPIRAÇÃO de Carlos Drummond de Andrade, teço um presente
para TODOS nós nesta tarde de quarta-feira. Não é um presente convencional.
Drummond não era convencional. Afirmo isso; sobretudo, porque não é um presente
material. Não estou nos presenteando com roupas da moda; com calçados caros; com um
carro de luxo ou com uma joia... Enfim, com NADA que nos favoreça apenas a APARÊNCIA
FÍSICA. Mesmo porque isso é o que menos importa... Somos como somos. Sob a
epiderme, somos todos iguais.
Trata-se de um presente para nossa alma. Cuja beleza e
leveza (estas sim!) são DIFERENTES. Mudam de pessoa para pessoa. São alteradas
de acordo com rumos de nossas vidas, de acordo com o que VALORIZAMOS ou
SUBESTIMAMOS e de acordo com as "bagagens" que colocamos sobre nossos ombros.
Muitas vezes, carregamos “PESOS” que não são, de verdade, os nossos. Particularmente, tenho
aprendido isso com a ajuda de algumas RARAS PESSOAS e com muita dificuldade.
Dificuldade esta que se torna irrisória diante do quanto nosso olhar se
distancia das pequenezas desta vida e se volta para aquilo que realmente importa: os sentimentos NOBRES e "INVENDÁVEIS"...
Nossa vida, por sua vez, passa veloz independentemente dos bens materiais que POSSUÍMOS; do que VESTIMOS; das MÁSCARAS que usamos. A vida é tão breve que, por vezes, atropela o corpo e entorpece os sentidos. Eis o perigo:
viver sem “desconfiar” do quanto a vida é rara; do quão rápido
envelheceremos... Sem pensar no que deixaremos ou levaremos dela...
Então, é chegada a hora de pisar no freio e repensar. Como
sabemos? Nossos ombros doem, porque o “peso” é grande. Doem porque não “carregamos” apenas nossa
PRÓPRIA VIDA; carregamos também outras tantas que, por algum motivo (nem sempre
legítimo e bem intencionado), nos interessam. Não reparar estes sinais é fatal.
Quando isso acontece, tem início um PROCESSO DE OCUPAÇÃO do “território humano”...
Sobra muito pouco ou nenhum espaço para nossa própria vida; para as bagagens
que, de fato, são nossas. É quando se instala o processo de DEGENERAÇÃO
mencionado por Drummond: “(...) E os olhos não choram. / E as mãos
tecem apenas o rude trabalho./ E o
coração está seco. (...)”.
Para nossa satisfação, a vida oferece oportunidades
diárias; hora a hora; a cada batida de coração. Enquanto vivermos, é
possível “RECOMEÇAR E MODIFICAR NOSSA HISTÓRIA” (não por acaso, ouvi isso hoje de
um destes Anjos que caminham sobre a Terra). Porém, perceber ou não estas “OPORTUNIDADES
DE RECOMEÇO E DE RENOVAÇÃO” depende do quanto estamos ou não ATENTOS às nossas
próprias atitudes, palavras e pensamentos. Ou seja, quanto mais prestarmos
atenção, antes, em nós mesmos, maior será a probabilidade de PERCEPÇÃO. Pois,
chega um determinado momento em que não nos restam muitas escolhas: ou somos
nós mesmos ou nos tornamos o que os outros querem que sejamos.
Sem dúvida, é essencial se importar com nosso semelhante; o
que é diferente de viver POR ELE. É essencial reconhecer nossos amigos; o que é
diferente de rotulá-los. É essencial olharmos as pessoas nos olhos; o que é
diferente de enxergar suas angústias e, sobre elas, tripudiar. Neste momento,
como diz Drummond: “os delicados preferem morrer”. Quanto a nós, qualquer um de
nós que tenha lido este artigo até aqui, não queremos morrer! Ao menos não sem, antes, descobrir ou, ao menos, ter uma VAGA ideia do que viemos fazer aqui e do
que estamos “trabalhando” para nos tornar.
Finalmente, para fortalecer essa NOSSA busca consciente, nada
como o poema de Drummond. Aproveite. Saboreie cada palavra. Ele é o “laço” do
presente que estamos oferecendo à nossa alma hoje.
Os Ombros Suportam o Mundo
(Carlos Drummond de
Andrade)
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
2 comentários:
Magnifico texto realmente suportar é uma dádiva, mais juntos todos nós suportaremos, pois temos um compromisso social, educacional, intelectual e sobretudo espiritual. Vamos juntos suportar a adversidade.
Com certeza Helena...
Sempre existirão obstáculos. A questão é aprender a lidar com eles. se não de modo a superá-los; mas, ao menos, aprender com eles.
Bju
Mari
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